No Rio Grande do Norte os últimos 20 anos foram marcados pela escalada da violência. Segundo o Atlas da Violência (IPEA), a taxa de homicídios que era de 9,6 pessoas por 100 mil habitantes em 2000, chegou a 62,8 em 2017, ano que apresentou uma das mais altas taxas nas CVLI’s (Condutas Violentas Letais Intencionais). Tamanho crescimento da violência está associado, dentre outros fatores, à invasão e consolidação de facções criminosas (particularmente o PCC e o Sindicato do RN), além da falta de maiores investimentos e planejamento por parte dos governos. Em 2017, as mortes ocorridas no sistema prisional de Alcaçuz colocaram o Rio Grande do Norte nos rankings internacionais de violência e de violação dos direitos humanos.
A partir de 2017, com a retomada do controle dos presídios por parte do governo do estado e a partir da implementação de ações conjuntas entre governo e Ministério Público, o estado passou a experimentar uma diminuição significativa das CVLI’s, com a redução de 18,6% entre 2017-2018 e de 26,1% de 2018 para 2019.

Dentre os fatores relacionados à redução da violência, pode-se destacar a retomada do controle prisional, a integração das ações de segurança pública, avanços na gestão das investigações da Divisão Especializada de Homicídios e Proteção à Pessoa, a realização de forças tarefas de investigação, a otimização de recursos humanos do policiamento ostensivo e a maior utilização dos dados criminais para análise e direcionamento de ações de policiamento e investigação (Revista Obvium, 2020).
Um dos grandes desafios da atual da gestão da segurança pública do estado é a continuidade da redução dos índices de CVLI’s, seguindo os parâmetros do Plano Nacional de Redução de Homicídios, que prevê uma diminuição de 5% ao ano. Mas como tem se comportado os índices mais recentes de violência diante à grave pandemia que estamos vivenciando e, em particular, diante do contexto de isolamento social da população? Sem o objetivo de esgotar a temática da violência, especialmente em relação às suas macrocausas e ao perfil sociodemográfico das vítimas – cujos estudos para o RN mostram a prevalência de jovens, negros e pardos, moradores de áreas periféricas, de baixa escolaridade e renda, desempregados e solteiros (Revista Obvium, 2020) – os dados a seguir mostram como tem se comportado as ocorrências de violência nos últimos dias. Isso é possível graças ao Sistema Metadados, da Rede e Instituto Marcos Dionísio de Pesquisa – Obvio, que possui um banco de dados interpolado com diversas fontes governamentais e não-governamentais (Datasus, Dados da Segurança Pública, ITEP, SISOBI, Ministério Público e algumas fontes jornalísticas previamente credenciadas).
Entre os dias 12 e 30 de março, período correspondente ao isolamento social, observa-se uma redução de 25,2% da violência no RN, quando comparado com o mesmo período no ano de 2019. E uma redução de 27% quando comparado com os 19 dias anteriores ao período de isolamento social (22 de fevereiro à 11 de março). Embora os resultados ainda sejam inconclusivos – pois, faz-se necessário observar o comportamento da violência durante o isolamento por um maior período – os resultados indicam que, provavelmente, o isolamento social contribuiu para a redução dos níveis de violência no Estado num ritmo ainda mais acelerado quando comparado com o mesmo período do ano anterior, e com o período imediatamente anterior ao início do estabelecimento do isolamento social.
Na Região Metropolitana de Natal, quando se compara o período de 12 a 30 de março (de isolamento social) com o ano anterior e com os 19 dias anteriores, verifica-se uma redução de, respectivamente, 25,3% e 23,4%, portanto similares ao observado no estado. No caso do município de Natal, as reduções são ainda mais acentuadas: 29,9% e 32,8%, respectivamente.
Em que pese a redução da violência nos últimos dias seja em comparação ao período de 19 dias imediatamente anterior ao isolamento social, como em relação ao mesmo período do ano anterior (ou mesmo diante à redução contínua da violência, observada desde 2017) é importante que a gestão pública e a população continuem vigilantes no combate à violência. Dados da Rede Óbvio mostram que, entre 2015 e 2019, apesar da redução de 13,1% das CVLI’s no estado, quando se considera os tipos de locais dos crimes, verifica-se um aumento de 575% das ocorrências dentro de veículos e 448% das ocorrências em residências e proximidades, em face à diminuição de 41% das ocorrências em vias públicas, de 68% em bares e restaurantes e de 97% em comunidades e favelas. Enfim, se no agregado temos uma redução da violência, por outro, temos um deslocamento dela em relação ao local de ocorrência.
Ivenio Hermes Junior – Coordenador de análises criminais do Governo do Estado do Rio Grande do Norte e Doutorando em demografia pelo Programa de Pós-Graduação em Demografia (PPGDem) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
Jarvis Campos – Demógrafo, professor do Departamento de Demografia e Ciências Atuariais (DDCA) e do Programa de Pós-Graduação em Demografia (PPGDem) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
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